Resumo Jurídico
O Crime Impossível: Uma Análise Jurídica do Artigo 224 do Código de Processo Penal
O artigo 224 do Código de Processo Penal (CPP) aborda a figura jurídica do crime impossível, também conhecido como tentativa inadequada ou crime fútil. Em termos simples, ele estabelece que não se pune a tentativa de cometer um crime quando, por absoluta impropriedade do objeto ou por absoluta impropriedade do meio empregado, o crime é, desde o seu início, impossível de ser consumado.
Para uma compreensão mais clara, podemos desmembrar os elementos essenciais deste artigo:
1. Impropriedade Absoluta do Objeto:
Refere-se à situação em que o alvo da ação criminosa é intrinsecamente incapaz de sofrer a conduta típica. Ou seja, aquilo que o agente tenta atingir não possui as características necessárias para que o crime se concretize.
Exemplo Educativo: Imagine que alguém tente roubar um objeto que já é de sua propriedade. A ação de subtrair algo que já lhe pertence não pode, por si só, configurar o crime de roubo, pois o objeto (a coisa alheia) não é apropriado para a consumação do delito. Outro exemplo seria tentar furtar uma folha de papel em branco com a intenção de imprimir um documento falso, quando a folha em branco, por si só, não tem valor econômico a ser subtraído.
2. Impropriedade Absoluta do Meio Empregado:
Aqui, a impossibilidade reside na ineficácia intrínseca do meio utilizado para a prática do crime. O instrumento ou o método escolhido pelo agente é tão inadequado que, por mais que ele se esforce, o resultado criminoso jamais poderá ser alcançado.
Exemplo Educativo: Considere alguém que tenta envenenar outra pessoa utilizando uma substância inofensiva, como água com açúcar, acreditando ser um veneno letal. O meio empregado (a água com açúcar) é absolutamente impróprio para causar a morte, tornando o crime impossível de ser consumado. Da mesma forma, tentar dar um tiro em alguém com uma arma completamente descarregada e sem condições de disparo, mesmo que haja a intenção de matar.
O Fundamento da Imunidade Penal:
O artigo 224 do CPP se alinha ao princípio da fragmentariedade do direito penal, que busca punir apenas as condutas que realmente afetam bens jurídicos relevantes. No caso do crime impossível, não há lesão ou sequer perigo concreto de lesão a nenhum bem jurídico tutelado pela lei penal. A conduta, embora com intenção criminosa, não tem o potencial de produzir um resultado antijurídico.
Distinção Crucial: Crime Impossível vs. Tentativa de Crime:
É fundamental diferenciar o crime impossível da tentativa de crime. Na tentativa, o agente inicia a execução do crime, mas este não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade ou por circunstâncias inerentes à ação. Ou seja, o objeto e o meio eram próprios, mas algo impediu a concretização do resultado.
Exemplo de Tentativa: Alguém tenta roubar uma carteira de um bolso, mas a vítima percebe e reage, impedindo a subtração. Aqui, o objeto (a carteira) e o meio (a mão para pegar) eram próprios para o crime de roubo, mas a consumação foi frustrada pela ação da vítima.
Conclusão:
O artigo 224 do CPP atua como um filtro necessário do sistema penal, evitando que o Estado puna condutas que, por sua natureza intrínseca, jamais poderiam resultar em um crime. Ele demonstra a preocupação do legislador em direcionar a persecução penal para aquilo que efetivamente representa um perigo real à sociedade, distinguindo a mera intenção ou a ação fadada ao fracasso daquela que pode concretamente lesionar ou pôr em risco um bem jurídico tutelado. Em suma, o crime impossível é uma manifestação da razoabilidade e da proporcionalidade no direito penal.