Resumo Jurídico
Furto Qualificado: Uma Análise do Artigo 155 do Código de Processo Penal
O artigo 155 do Código de Processo Penal (CPP) é um dos pilares do direito penal brasileiro, definindo o crime de furto e suas diversas formas. Este artigo, de fundamental importância para a compreensão da proteção patrimonial em nosso ordenamento jurídico, estabelece as condutas que caracterizam o furto, bem como as circunstâncias que o tornam mais grave, resultando em penas mais severas.
O Furto Simples: A Subtração da Coisa Alheia Móvel
Em sua forma mais elementar, o artigo 155 dispõe que o furto é o ato de subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel. Vamos desmembrar cada um desses elementos:
- Subtrair: Refere-se ao ato de retirar algo da posse de alguém sem o seu consentimento. É a ação de tomar para si o que não lhe pertence.
- Para si ou para outrem: Indica que o agente pode agir em benefício próprio ou em benefício de terceiros. O intuito de obter vantagem, seja direta ou indiretamente, é crucial.
- Coisa alheia: O objeto do furto deve pertencer a outra pessoa. Não se pode furtar algo que já lhe pertence ou que está abandonado (res derelicta).
- Móvel: A coisa subtraída deve ter a capacidade de ser deslocada, ou seja, ser um bem que pode ser transportado de um lugar para outro. Imóveis, por exemplo, não são objeto do crime de furto, mas sim de outros crimes como a invasão de propriedade.
Exemplo: Pegar uma carteira da bolsa de outra pessoa sem permissão e levá-la para casa configura furto simples.
As Qualificadoras: Quando o Furto se Torna Mais Grave
A grande inovação do artigo 155 reside em detalhar as situações em que o furto deixa de ser simples e se torna qualificado. As qualificadoras são circunstâncias que, por aumentarem o grau de reprovação da conduta, a tornam mais perigosa ou danosa à vítima e à sociedade, resultando em penas mais elevadas.
O parágrafo 4º do artigo 155 enumera as principais qualificadoras, que podem ser divididas em quatro incisos:
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Com destruição ou rompimento de obstáculo: Esta qualificadora se aplica quando o agente utiliza de meios para vencer barreiras físicas que protegem o bem subtraído. Exemplos incluem arrombar uma porta, quebrar uma janela, cortar uma cerca ou utilizar ferramentas para abrir um cofre. A exigência é que o obstáculo seja realmente destinado à proteção da coisa.
- Exemplo: Arrombar a porta de uma loja para subtrair mercadorias.
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Com abuso de confiança: Ocorre quando o agente se aproveita da relação de confiança que possui com o proprietário do bem. Essa confiança é quebrada pela ação delituosa. Exemplos incluem empregados que furtam de seus empregadores, amigos que furtam de seus amigos íntimos ou familiares que furtam de outros membros da família.
- Exemplo: Um empregado doméstico que furta joias de seus patrões.
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Com escalada: Refere-se à utilização de meios incomuns para atingir o local onde se encontra o bem. Inclui subir em muros, telhados, descer por cordas ou utilizar qualquer outro meio que demonstre uma subida ou descida mais elaborada e perigosa para alcançar o objeto do furto.
- Exemplo: Pular o muro alto de uma residência para entrar e furtar.
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Mediante fraude: Nesta hipótese, o agente utiliza de artifícios ou manobras para enganar a vítima, fazendo com que ela, de alguma forma, facilite a subtração do bem. A fraude é o meio utilizado para ludibriar a vítima e conseguir a posse do objeto.
- Exemplo: Um vendedor que se passa por fiscal para entrar em uma casa e subtrair objetos de valor.
Outras Qualificadoras e Peculiaridades
O mesmo parágrafo 4º do artigo 155 traz outras situações que também configuram furto qualificado:
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Com emprego de chave falsa: Utilizar chaves que não são as originais, sejam elas roubadas, falsificadas ou simplesmente obtidas de forma indevida, para abrir portas ou objetos e subtrair bens.
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Com concurso de duas ou mais pessoas: Quando o furto é praticado em conjunto por duas ou mais pessoas, mesmo que cada uma desempenhe um papel distinto na execução do crime. A presença de um cúmplice aumenta o perigo e a possibilidade de sucesso da empreitada criminosa.
- Exemplo: Um grupo de amigos que planeja e executa o furto de um veículo.
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Com emprego de explosivo ou artefato análogo que cause perigo comum: Esta é uma qualificadora mais recente, adicionada para abarcar situações de maior periculosidade, onde o uso de explosivos para acessar o bem gera risco à coletividade.
Furto de Veículo Automotor: Um Agravante Específico
O parágrafo 5º do artigo 155 estabelece uma qualificadora específica e de grande relevância prática: o furto de veículo automotor subtraído para fim de remoção de sinais identificadores e adulteração ou remarcação de chassi ou de qualquer elemento de identificação do veículo automotor, objeto material do crime.
Isso significa que o furto de um carro se torna qualificado não apenas pela simples subtração, mas quando há a intenção de descaracterizá-lo, seja para revenda ilegal, clonagem ou uso em outros crimes. Esta qualificadora visa coibir o roubo e o desmanche de veículos, um problema recorrente em muitas cidades.
Conclusão
O artigo 155 do Código de Processo Penal é um dispositivo legal robusto que busca proteger o patrimônio alheio de diversas formas de subtração. A distinção entre furto simples e furto qualificado é crucial para a correta aplicação da lei penal, refletindo a proporcionalidade da pena à gravidade da conduta. O estudo detalhado de suas qualificadoras é essencial para profissionais do direito, estudantes e para todos que buscam compreender as nuances do crime de furto em nosso ordenamento jurídico.